17 de fevereiro de 2014

"….PORQUE É QUE NÃO ÉS COMO O NATALINO?" (1)


foto de arquivo da Família

 Natalino dos Santos Rodelo
19.01.1941 – 29.11.2013
Póvoa (Bustos) – Boliqueime (Loulé)

Filho de Adriano dos Santos Rodelo e de Caurina Mota
Casado com Irene Silva Ferreira Rodelo.
Os filhos, Dean Ferreira Rodelo e  Diana Ferreira Rodelo (e aqui),  são professores de Matemática 

“A minha paz
residia debaixo daquele tecto (2)
[na alfaiataria do Ti Adriano]
(Carlos Luzio)

Natalino Rodelo foi um cidadão exemplar da diáspora de Bustos, dedicado *a Família, profissional com nome firmado, autodidata em busca do saber e do belo, dirigente associativo, … a sua presença em atos públicos  era marcada pela discrição. Desde muito cedo revelou aptidões para a escrita e para o desenho.  
Casa de Bustos  –  Adriano Rodelo e Caurina Mota com o «Lorde» (5) (sentado)
A ponta de cigarro tenta passar camuflada   foto de arquivo da Família
O professor Manuel Pires, extraordinário preparador dos alunos para enfrentar o exame de admissão aos Liceus, elogiava amiudadas vezes as suas redações.
Ouçamos o loquaz Élio Freitas, companheiro e testemunha privilegiada do então vizinho e amigo Natalino:
Memórias da Rua da Póvoa






De toda a rapaziada 
da Rua da Póvoa, 
o Natalino 
era o mais escravo,
mais sacrificado de todos.

Desde que me lembro, o Natalino e a sua irmã Marlene trabalhavam todos os dias ao lado dos seus pais, Adriano e Caurina, na alfaiataria…
Caurina Mota  e  Adriano dos Santos Rodelo
foto de arquivo da Família

Enquanto a malta brincava e fazia trinta por uma linha, o nosso amigo Natalino lá estava todos os dias a ajudar na alfaiataria.

O Sr. Adriano era muito restrito com os filhos. A solução era simples:
Nós íamos ter com ele à alfaiataria. Quando eu e outros queríamos ler uma revista como o Mundo de Aventuras, ou Revistas de filmes, a nossa biblioteca era a alfaiataria Adriano. O Natalino assinava as melhores revistas juvenis e isso atraía os colegas para ler e visitar o amigo…
Rua da Póvoa – Alfaiataria antes da remodelação da casa (actual casa de Milton Luzio)

O local de encontro diário para muitos jovens da zona era a alfaiataria por causa da leitura das revistas…e o Natalino sabia que isso era uma maneira de compensar o facto de ele ter de estar sempre amarrado ao trabalho e não poder sair a brincar com e resto dos amigos da Rua.



foto de arquivo da Família

O Natalino era o modelo de rapaz que todas as mães da Rua da Póvoa usavam para exemplo dos filhos…."Porque é que não és como o Natalino?" E todos os que o conheciam tinham-lhe muito carinho e respeito, porque sabiam o sacrifício que ele fazia para obedecer ao pai Adriano…
Aos Domingos lá vinha a oportunidade de uma festa ou baile, e os colegas da Rua da Póvoa aí estavam todos contentes por acompanhar o modelo amigo Natalino a passar umas horas alegres como qualquer jovem da sua idade. 
Memórias que nunca morrem, dum amigo de sempre, dum jovem educado e totalmente dedicado á sua família(Élio Freitas, Califórnia) 

Um aparte: A “escola” dos seus Pais (Caurina e Adriano) deu frutos sãos e merece uma reflexão a ser feita pelos educadores de hoje.

O ambiente da Alfaiataria transposto por Carlos Luzio em dois poemas “Ti Adriano – Alfaiate” e “Entre Panos e Linhas” “oferecem-nos um retrato comovente daquele que fora noutros tempos, um importante ponto de encontro desta aldeia, …” (3) (Michel Mota).
Bustos - Casa do Sr. Adriano -  A Alfaiataria foi "um importante ponto de encontro" (Michele Mota)
foto de arquivo da Família 

É naquele primeiro poema que o Natalino fica a ser registado com o atributo de o «Linhas», conforme o excerto de “Ti Adriano-Alfaiate (4) …:

Recordo as tardes a ouvir música num velho gravador
Não era música do teu tempo, não senhor
Eram canções que ouvia como se fossem minhas
Que gostavam ao “Lorde” (5) e ao “Linhas” .
(Carlos Luzio, Pescador de Sonhos)

 Com naturalidade e muito trabalho, gosto e dedicação, o Natalino fez-se à vida.
Um vivo agradecimento às informações prestadas pela Irene Rodelo que vão preencher uma parte do seu invejável  
curriculum:

 - Emigrou para os Estados Unidos em 26(?)-02, 1966.
- No início trabalhou em 2 fábricas, tendo depois voltado à sua profissão de "Alfaiate"
.
Casa da Póvoa,         foto de arquivo da Família

- Regressou a Portugal em 25-06,1982.
- Foi Alfaiate de profissão em Portugal e também nos últimos 7 anos nos States.
-
- Em Portugal aprendeu a podar as árvores e adorava cuidar do Pomar.

Desenho – A Sua Preferência
A ocupação preferida era o desenho o qual fez um curso com a C.E.A.C.
Dean, desenhado pelo Natalino
O desenho dele mais conhecido entre os amigos é do centro de Bustos, (…) ele fez em tamanho A4 o qual foi enviado aos professores para avaliação. Depois fez o mesmo ampliado o qual ofereceu à Junta de Freguesia na altura de uma cerimónia do 18 de Fevereiro, creio que foi pelas Bodas de Ouro da nossa Freguesia
Ao serviço da comunidade


 - Fez parte  dos cantares do Orfeão de Bustos com os filhos durante uns anos.

- Esteve integrado na Direção do Orfeão durante alguns mandatos.
- Ajudou a organizar várias atividades do Orfeão como  as aulas de música, corridas BTT as quais ele fazia os desenhos para os anúncios das mesmas e também o desenho do símbolo de Bustos. 
 Todos esses trabalhos da escola que ele tinha como relíquias tinham desaparecido durante o tempo que esteve emigrado.

O Cidadão Natalino nos States
(Estados Unidos da América)

FORMAÇÃO
O Natalino estudou Inglês em escola noturna.

INTERVENÇÃO CÍVICA
.
- Fez parte da direcção do nosso Luso American Portuguese Club em alguns mandatos., tendo participado  na organização de:
 . Visitas a museus em Nova York,
. Festas de Concursos como Vestido de Chita,
. Festas das Colheitas em que representávamos as colheitas do nosso Portugal.
(Nota: As nossas concorrentes ganhavam Prémios. Por sinal uma miúda da Mamarrosa ganhou o primeiro Prémio que foi uma viagem a Portugal.) 

Apetência para a Escrita

A veia de escritor já se manifestara no tempo da Escola Primária.
Escreveu poesia que um dia poderá vir a lume.
Venceu concursos de quadras.
"O Natalino escrevia coisas muito bonitas, mais nas cartas para familiares e amigos, tinha uma veia cómica e outra sentimental, umas faziam chorar, outras chorar de rir. Ele era um SONHADOR!....AND I MISS HIM SO....”

… AND I MISS HIM SO.... (Irene Rodelo)

A Família
foto de arquivo da Família

A expressão sentida pela Irene diz tudo.
A Irene e o Natalino foram atingidos pela seta do Cupido, conhecedor do DNA dos dois. O Amor frutificou. A replicação genética continuará a ser acarinhada e irá manifestar-se através de gerações. 

*

Sempre dedicado à Família,
Nos States - batizado da Diana:
Helena (irmã) da Irene; Natalino, Irene e Dean; Caurina com Diana ao colo e Adriano

foto de arquivo da Família
o Natalino viveu num patamar mais elevado, onde se encontram o Desenho, a Música, a Natureza. Daí sonhou elevar o Homem.
Por certo, o Natalino também teria adotado a citação de  Steve Jobs ,: retirado daqui
“Para mim, não há nada mais importante no futuro que o desenho. É a alma de tudo o que é criado pelo homem”.
*
A encerrar esta singela evocação do Natalino dos Santos Rodelo, nada será mais oportuno do que incluir o depoimento do irmão do Élio, Alcides Freitas:

Natalino dos Santos Rodelo -  in memorium
O Natalino
“seguia fielmente
as instruções dos pais”
Alcides Freitas

Convívio – Sentados: Élio, Natalino (anfitrião) e Helen;
De pé – Alcides, Fernando Luzio, Celeste e Irene (anfitriã)
foto de arquivo da Família

O Natalino tinha as suas raízes na Póvoa e foi ai que cresceu, brincando com os miúdos vizinhos, buscando ninhos, jogando o pião, armando costelos, mas nunca metido em sarilhos com ninguém. Ele seguia fielmente as instruções dos pais e se saía fora da linha, lá estava o Sr. Adriano para lhe dar os seus conselhos e não só. Dos pais herdou um grande respeito pelo próximo e disciplina no desempenho dos serviços de casa e trabalhos de escola. A verdade é que o nosso amigo adorava brincar com os amigos mas o pai raramente o autorizava a afastar-se de casa.
No entanto, era na casa dele, na alfaiataria do pai, que eu e o Élio e outros miúdos nos juntávamos para ler “O Mundo de Aventuras” que chegava todas as Quartas Feiras às mãos do Natalino através dos Correios. Líamos e relíamos todas aventuras do semanal. Que boas memórias...

Com o terminar da Escola Primária, o Natalino que sempre teve um bom aproveitamento escolar, gostava muito de continuar a estudar, mas os pais deram-lhe a saber que muito embora gostassem que ele fosse estudar, isso não seria possível porque não havia bens que o permitissem. E assim, com o terminar do exame de admissão aos Liceus, o Natalino começou a dedicar-se completamente à arte de alfaiate. O nosso amigo começou a viver uma vida de adulto desde a tenra idade dos onze anos. Os anos passaram. Cada um de nós tomou o seu rumo, mas a nossa amizade manteve-se através dos anos.   
O Natalino sempre será para mim o grande amigo da minha mocidade.
 (Alcides Freitas, Califórnia)

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Notas:
a) O Natalino também merece que surja mais do que uma biografia
b) A organização desta peça foi possível graças à participação direta ou indireta de vários coadjuvantes. O meu bem haja, sérgio micaelo ferreira
Em rodapé:
(1)    Título emprestado por Élio Freitas
(2)     Carlos Luzio, Pescador de Sonhos, Entre Panos e Linhas (na Alfaiataria do Ti Adriano), p. 108, edição póstuma feita por amigos do autor, Bustos -2005.
(3)    Michele Mota, Pescador de Sonhos – Uma Análise, p. 30
(4)     Carlos Luzio, Pescador de Sonhos, “Ti Adriano – Alfaiate” , p. 106
(5)     «Lorde», Idílio Rosário – alfaiate, empregado do Sr. Adriano.

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