25 de novembro de 2007

“...hoje faz as nações fortes – a ideia.” (EQ)

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O leitor compreende agora as razões de ordem íntima que impediram o meu amigo e colega Pinheiro Chagas de me citar? Bem: deixe-me então pôr-lhe diante dos olhos outro período da Gazeta de Notícias. Escrevi eu: «Mas a verdade é que numa época tão intelectual, tão crítica, tão científica como a nossa, não se ganha a admiração universal, ou se seja nação ou indivíduo, só com ter propósito nas ruas e pagar lealmente ao padeiro. São qualidades excelentes, mas insuficientes. Requer-se mais: requer-se a forte cultura, a fecunda elevação de espírito, a fina educação do gosto, a base científica, a altura de ideal, que na França, na Inglaterra, ou na Alemanha inspiram na ordem intelectual a triunfante marcha para a frente, e nas nações de faculdades menos criadoras, na pequena Holanda ou na pequena Suécia, produzem esse conjunto eminente de sábias instituições que são, na ordem social, a realização de formas superiores de pensamento.»

Este é que devia ser (e creio que realmente é) o ponto em discussão entre nós. Eu digo que Portugal, nesta época em que não pode fazer conquistas, nem tem já continentes a descobrir, deve esforçar-se por ganhar um lugar entre as nações civilizadas pela sua educação, a sua literatura, a sua ciência, a sua arte – provando assim que ainda existe, porque ainda pensa.

Fomos grandes pelo que outrora fazia as nações grandes – a força; procuremos tomar-nos fortes pelo que hoje faz as nações fortes – a ideia. Foi esta nobre superioridade que eu desejei à minha pátria.

Você, meu caro Chagas, a isto responde: que Portugal não: necessita ciência, nem gosto, nem literatura, nem arte, nem cultura, nem um conjunto de sábias instituições; e que desejar-lhe tais vantagens é insultá-lo! E você dá a razão por que Portugal não precisa nada disto: é, diz você, porque Portugal outrora possuiu Cochim e Cananor, e porque o nome português é ainda respeitado em Ceilão!

Porque o não tinha dito há mais tempo, meu caro Chagas? Estou vencido.
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in Eça de Queiroz, Notas Contemporâneas, [Brasil e Portugal, Bristol 14 Dezembro de 1880], Obras Completas de E Q, XV Volume, Círculo de Leitores.

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