25 de março de 2007

HILÁRIO COSTA -1 "ESCRAVO QUE NUNCA FOI..." (Rosinda de Oliveira)

Eis o discurso da escritora Rosinda de Oliveira.
(Esclarecimento: Se porventura houver alguma imprecisão na peça agora publicada, a responsabilidade é tão só do editor.)
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Ex.mas Autoridades
Ex.ma Comissão organizadora desta homenagem

Minhas senhoras e meus senhores:
Decerto será até um atrevimento petulante da minha parte, falar de um homem com Hilário Costa, eu, que nem sequer sou de Bustos.

Todavia, porque tive a subida honra de o conhecer um pouco de perto, eu não ficaria de bem com a minha consciência, se hoje, no seu 100º aniversário não viesse aqui deixar o seu humilde testemunho e a minha sincera homenagem – ao cidadão, ao democrata e ao benemérito – Hilário Costa.

Homem de fibra rija foi na vida um lutador inconformado. Inconformado com a política do seu tempo, com as várias carências socio-económicas, com os grandes desníveis sociais e culturais, com os atrasos e as desigualdades.
Tudo isto tocava profundamente o seu espírito livre e ávido de democracia e igualdade. Os seus ideais nunca se conformaram com a tacanha mesquinhez dos tempos que corriam e tudo fez para ver se conseguia modificar essas vivências, de grande parte do século XX.

De uma família numerosa de 9 filhos – Hilário Costa ficou sem pai aos dois anos de idade. Bem cedo conheceu as agruras da vida quotidiana, mas também bem cedo mostrou a sua extraordinária capacidade de lutador incansável e destemido.

Pois, apenas com 13 anos, ei-lo à frente de uma taberna e mercearia, na própria casa dos pais, chegando a trabalhar ainda no comércio do seu tio – outro ilustre bustuense – Augusto Costa.

Mas em 1926, portanto com 19 anos de idade, emigra. Passa por Lisboa, Espanha e França, mas é a América do Norte o seu destino. E é aí que trabalha e trabalha mesmo duramente.

Minhas senhoras e meus senhores

Não foi fácil a vida de Hilário Costa.
Roído de saudades, com certeza quantas vezes de coração a sangrar, este homem abnegado e generoso mostrou sempre uma vontade indomável de vencer, enfrentado todos os desafios da sorte com uma coragem e determinação só próprias das almas grandes.

Na América trabalhou primeiro numa fábrica de escultura – Podemos lembrar a propósito os vários bustos modelados por Hilário Costa e algumas pinturas que ele ofertou generosamente a instituições de Bustos e que atestam bem a sua invulgar sensibilidade e inspiração estética.

Contudo, a dureza da sua vida, ele sentiu-a principalmente ao trabalhar na construção de estradas.

Não resisto a transcrever aqui as suas próprias palavras

“de pá e picareta ou com um marrão pesadíssimo a partir pedra como escravo”

Escravo que nunca foi porque o seu espírito sempre voou mais alto, muito alto, pairando nos domínios do intelecto onde buscava avidamente todos os meandros do saber, da cultura, quer no domínio das artes, quer no domínio da palavra oral ou escrita.

E no seu peito, palpitante, de ânsias de liberdade e fraternidade, moravam a sua família, a sua terra, os seus conterrâneos

À medida que conseguia um certo desafogo económico, cada vez ais estudava, lia e escrevia, ao mesmo tempo que procurava proporcionar aos seus descendentes – oportunidades a que ele não tivera acesso na sua infância e juventude, dedicando-se igualmente de alma e coração a colaborar no engrandecimento, progresso e bem-estar da sua terra e dos seus habitantes.

Sempre entusiasta, activo e empreendedor funda até, na colónia portuguesa americana, o jornal “Farol da Liberdade” – para aí dar largas aos seus sonhos e aos seus ideais, procurando unir todos os emigrantes, em especial, os bustuenses e de defender os seus legítimos interesses – e publica livros de prosa e poesia.

Mas o seu peito palpita de sonho e emoção, principalmente pós o 25 de Abril de 1974. Empolgado na luta pela liberdade que para si, era quase um sacerdócio, rodeia-se de vários amigos que com ele partilham e comungam dos mesmos ideais e é com um desses amigos que aqui lança outro jornal “Bairrada Livre”

Esse amigo é o Dr. Manuel dos Santos Pato da Mamarrosa, terra que também tem para com Hilário Costa uma antiga dívida de gratidão.

Hilário Costa amava a Banda Filarmónica da Mamarrosa com um desvelo e uma dedicação fora do vulgar. Dir-se-ia que tratava esta Banda quase como a menina dos seus olhos, sendo o seu 1º sócio honorário. Aliás, os altos serviços prestados à Banda por Hilário Costa foram reconhecidos pela Direcção da Associação Beneficente Cultura e Recreio da Mamarrosa ao homenageá-lo, em sessão de 1984, com um pergaminho e no 70º aniversário da Banda em 1986, com uma medalha – relíquias que, decerto a família ainda hoje guarda na sua saudade, com afecto e carinho.

Minhas senhoras e meus senhores

Muito mais há que dizer sobre as várias facetas da riquíssima personalidade deste homem de carácter, impoluto, forjado e temperado no cadinho da luta e da perseverança.

Mas não me vou alongar mais.

Todavia, permitam-me ainda que chame a atenção de todos para a família de Hilário Costa que foi seu apoio, abrigo e porto seguro.
E muito especial, para a sua digníssima esposa, a senhora D. Aldina Costa, sua sempre fiel colaboradora, defensora e incentivadora e que tem procurado seguir as suas pisadas.

Ela e os seus familiares são bem dignos deste momento de homenagem que de justiça também lhes pertence.
Aproveito para felicitar o povo de Bustos por esta tão feliz iniciativa. Lembrando e homenageando um dos valores da sua terra, está também a contribuir para proporcionar aos mais novos e aos vindouros, um marco que lhes servirá de exemplo a apontar os caminhos do futuro.

E agora sim, vou terminar.

Hilário Costa dominava a palavra que usava com instrumento de comunicação, mas essencialmente como arma de libertação, de progresso e trabalho e ainda como expressão de amor à família e à sua terra que ele amava acima de tudo.
Portanto, é com uma poesia que Hilário Costa fez há 53 anos que eu vos deixo.
À Minha Terra[1]
Sinto uma grande Saudade
– Imensa, profunda, infinda –
Por tudo quanto tu és,
– Grande Bustos – Terra linda!

Desse teu povo heróico,
Activo, forte risonho,
Que moureja noite e dia
E que vive a arder num sonho!

Dos teus campos verdejantes
Com vinhas e milheirais...
E das doces melodias
Trinadas pelos pinhais!...

Suave cachoar das fontes,
Do cantar das lavadeiras,
E das histórias contadas,
Há noite, pelas lareiras!

Dos caminhos e carreiros,
Através de toda a aldeia,
E das Moças a ceifar,
Em noites de lua cheia!

Das vindimas e colheitas,
Tão cheias de animação,
E das horas de folguedo,
Na noite de S. João!

Desse teu grande Mercado
Que eu ajudei a dar «vida»
E da velha Mocidade
Da «União Desportiva...»

E dessa antiga morada
Onde nasci e brinquei...
E do pomar perfumado
Que tristemente deixei!

E dos velhinhos que vi
Ao sol e de pau na mão...
– Ao recordá-los eu sinto
Uma dor no coração!...

E das meigas criancinhas
E de tudo, afinal!
– Rouxinois … e andorinhas
E céu azul de Portugal!

Por toda a parte há canções,
Mocidade e alegria!
Flores, beleza e encanto
– Minha amarga nostalgia!

Pudesse eu erguer um canto
Que agitasse corações …
Na doce linguagem lusa
– Tal como cantou Camões!

Mas não posso, pobre Musa!
Não posso, Bustos querido!
– Contudo, assim cantar,
Dou prova de grande amigo!


[1] Hilário Costa, Versos dum emigrante, edição do autor, Estados Unidos da América do Norte, 1954.



1 comentário:

  1. chamo-me FERNANDO AUGUSTO BORGES DA COSTA e sou filho de MANUEL SIMOES DA COSTA, seu primo direito. Estou a fazer uma arvore genealogica, com o fim de tentar a nao separaçao da "familia costa". O site é: "www.myheritage.com.pt" - costa web site

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