26 de abril de 2006

ESPERO A MINHA LIBERDADE (Arlindo Vicente)

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«'Conclusões' da Carta ao Juiz Corregedor». Autos de Segurança, processo nº 16.068/62, do 1º Juízo Criminal de Lisboa, fls. 182 e 183
1.°) - Nasci filho legítimo de uma família da média burguesia e fui educado, com meus irmãos na honra, na generosidade, no respeito pelos direitos e dignidade do próximo e na ajuda e socorro dos mais humildes.

2.°) - Meus Pais eram católicos e liberais – no perfeito sentido da palavra - e assim nos educaram.

3.°) - Meus Pais eram democráticos e nunca compraram para um filho um objecto que o não comprassem, também para os outros.

4.°) - Fui educado no respeito da verdade e da minha própria pessoa e dignidade.

5.°) - Procurei sempre ser justo e generoso.

6.°) - Casei-me por amor na igreja de Sangalhos e assim nas tradições de meus Pais e de minha Mulher, eduquei os meus três filhos também.

7.°) - Meus filhos têm cursos superiores, assim como minha Mulher.

8.°) - Dei a meus filhos o meu exemplo cívico e educação religiosa e não me poupei a sacrifícios, apesar das minhas dificuldades pois eles cursaram colégios qualificados e até minha Filha foi aluna do colégio de freiras da Av. Manuel da Maia.

9.°) - Tenho três netos, orientados como eu e os meus filhos o foram exactamente, para que possam ser livres e conscientes.

10.°) - Obtive pelo meu trabalho alguns bens que juntei aos que herdei de meus Pais e de meus Sogros, para suprir a eventual miséria da falta de saúde. Porém

11.°) - Porque fui candidato à Presidência da República, sou vítima de um insidioso, falso e malévolo processo, onde somente ressalta o desejo da minha aniquilação.

12.°) - Tal processo não é o meu retrato, mas o retrato da Pide.

13.°) - Esta pretende aniquilar-me, só porque participei numas eleições e assim quer aniquilar qualquer oposição.

14.°) - Com o seu processo contra o signatário mostram o seu inteiro desrespeito pela Lei e pela Justiça.

15.°) - Tais factos e a circunstância de termos chegado no nosso País ao extremo limite de ver destruídos todos os direitos cívicos fundamentais e até na profissão do signatário serem, como a Polícia pretende, coarctados os direitos de livre exercício, impuseram a actuação do homem e do advogado nessas eleições.

16.°) - As alegações que pretendem a minha prisão mostram claramente o arbítrio de que são passivos todos aqueles que não aceitam o partido único, como solução nacional imposta.

Por tudo, eu,

17.°) - Como um desses homens, mas criado e educado na fé da Lei e da Justiça, da pureza e da independência delas, até ao fim dos séculos,

Espero a minha liberdade

Cadeia de Caxias, Reduto Morte, um de Fevereiro de 1962 (dois).

O presidiário as. Arlindo Augusto Pires Vicente.
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[in Guia da Exposição - na Casa Municipal - organizada pela Comissão Promotora do Centenário do nascimento de Arlindo Vicente]

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